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segunda-feira, 25 de maio de 2015

MAC e EPA encerram a 13ª. Semana de Museus no 'Subterrâneo'

No último domingo, dia 24, uma parceria entre o MAC, o Espelogrupo Pains (EPA) e a Prefeitura Municipal de Pains, encerrou nossa 13ª Semana de Museus, cuja edição de 2015 teve como tema: "Museus para uma sociedade sustentável". O objetivo do dia foi realizar uma atividade de campo com estudantes universitários de cursos ligados ao patrimônio natural brasileiro, ou seja, ao meio ambiente.

O grupo de participantes foi composto por oito integrantes do EPA, incluindo o Presidente do grupo, Paulo Oliveira, o Prof. Lucélio Nativo, do Centro Universitário de Formiga (UNIFOR), dezessete estudantes de graduação desta universidade, dos cursos de Engenharia Ambiental, Engenharia Agronômica e Ciências Biológicas, além de um estudante do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG (ICB). A exceção dos integrantes do EPA, mais da metade do grupo não tinha tido qualquer tipo de contato com o microambiente das cavidades naturais ou  tido conhecimento de sítios arqueológicos (foto 1).

As atividades começaram pela manhã, com cerca de duas horas de exposição teórica, cuja primeira metade contou com uma palestra do Prof. Lucélio Nativo sobre os sistemas cársticos e o potencial de pesquisa inerente a tais paisagens nos campos da: Biologia, Paleontologia e Espeleologia (foto 2). Sua apresentação usou de farta documentação sobre nossa região, o Carste do Alto São Francisco, destacando sua fragilidade ambiental e a necessidade de aumento das ações de pesquisa científica e implantação de unidades de conservação e preservação ambiental.

A segunda metade da exposição contou com uma palestra do arqueólogo Gilmar Henriques sobre a Arqueologia Regional do Carste do Alto São Francisco, focada em exemplos de sítios arqueológicos em grutas calcárias. Sua palestra foi seguida de uma visita guiada à exposição permanente do museu, denominada: "Pré-histórica do Carste do Alto São Francisco: 12.000 anos a serem desvendados", na qual os estudantes tiveram um contato direto com vários objetos e materiais coletados em escavações arqueológicas.

A palestra e a visita guiada tiveram o objetivo de alertar os estudantes de graduação para a fragilidade do registro arqueológico em cavernas, caracterizado por solos culturais superficiais de espessura delgada, às vezes com uma dezena de centímetros, ou menos, e textura pulverulenta. Tais solos arqueológicos são distorcidos e compactados quando pisoteados, e o estrago é proporcional ao número de visitantes e dinâmica de circulação das pessoas. Por vezes, os estratos de solo superficial podem guardar registros de ocupações que remontam a sete séculos.

Daí a necessidade urgente de se executar um plano de manejo para uma ou mais cavernas da região, a fim de prepará-la(s) para uma visitação pública adequada, que atenda aos critérios técnicos que norteiam os melhores exemplos de turismo cultural e ecológico da atualidade. Isto atenderia a uma demanda crescente por parte do público em geral, que deseja conhecer o ambiente subterrâneo das cavernas calcárias, muitas vezes lançando mão de práticas de turismo que são inadequadas para o frágil ambiente das cavernas e abrigos rochosos.

Clique na imagem para ampliar. 1. Estudantes e espeleólogos do EPA em frente a sede do MAC, na cidade de Pains - MG. 2. Sala de audiovisual, palestra do Prof. Lucélio Nativo sobre o Carste do Alto São Francisco e seu potencial para pesquisas científicas. 3. Entrada da Gruta do Brega. 4 a 6. Primeiro grande salão no interior da Gruta do Brega. O local é coberto por uma espessa camada de lama e é decorado por um imenso espeleologia.

Depois da exposição teórica na sede do museu tiveram início as atividades de campo, executadas com o apoio logístico da Prefeitura Municipal de Pains, e perfazendo um total de cinco horas de duração. Foi feita uma visita monitorada a duas cavernas com presença de registro arqueológico indígena: a Gruta do Brega, no Ribeirão dos Patos, zona rural do município de Pains, e a Gruta Milagres, no Córrego Barreado, zona rural do município de Doresópolis. Ambas as grutas estão entre as cavidades naturais com maiores dimensões de nossa região, e são sítios arqueológicos com alto potencial de pesquisa¹.

Gruta do Brega está situada na porção centro sul do Carste do Alto São Francisco. Possui pouco menos de setecentos metros de desenvolvimento linear. Seu interior é caracterizado por amplos salões com presença de diversos espeleotemas, tais como: estalactites, estalagmites, coraloides, cortinas, escorrimentos e bacias de travertinos (fotos 4 a 6). Essa gruta pode ser utilizada como uma passagem subterrânea que possibilita atravessar um monte de lado a lado.

Clique na imagem para ampliar. Localização da Gruta do Brega, margem esquerda do Ribeirão dos Patos, zona rural do município de Pains - MG, na porção centro sul do território do Carste do Alto São Francisco. Extraído do Google Earth e Wikimedia Foundation.

Em sua entrada principal, que é voltada para a direção oeste, há um grande sítio arqueológico indígena, com centenas de fragmentos que integravam vasilhames cerâmicos de diversas formas e tamanhos. O registro arqueológico ocupa tanto a zona abrigada, na entrada da gruta, quanto a zona exterior, a céu aberto. Na zona abrigada há ainda um sedimento pulverulento de cor cinza, sobre o qual jazem os fragmentos cerâmicos. Uma curiosidade do local é um fragmento cerâmico que foi "cimentado" na superfície rochosa,  ele foi depositado na zona atingida pelo gotejamento de água saturada por carbonatos, que levou a formação de um espeleotema que envolveu o artefato, processo que pode ter demandado séculos de duração.

Terminada a visita ao primeiro salão da Gruta do Brega, as atividades de campo prosseguiram, agora na Gruta Milagres, na porção oeste do Carste do Alto São Francisco. Esta gruta está situada no médio curso do Córrego Barreado, tributário do Córrego dos Cavalos, que por sua vez é afluente do Ribeirão dos Patos. A gruta é um ponto de sumidouro e de surgência do Barreado, que nesta área se torna subterrâneo e aflora, em diferentes pontos.
      
Clique na imagem para ampliar. Localização da Gruta Milagres, um sumidouro e surgência do Córrego Barreado, zona rural do município de Doresópolis - MG, porção oeste do território do Carste do Alto São Francisco. Extraído do Google Earth e Wikimedia Foundation.
  
A microbacia deste córrego é rica em feições espeleológicas, com muitas cavernas e abrigos rochosos, e possui um grande número de sítios arqueológicos. A exposição permanente do MAC conta com um grande vasilhame cerâmico indígena que foi encontrado inteiro, sobre a superfície do interior de uma grande gruta da região do Barreado, denominada Gruta dos Óculos.

A Gruta Milagres é um dos principais sítios arqueológicos e espeleológicos da região do Córrego Barreado. Possui aproximadamente cem metros de desenvolvimento linear e seu interior é fartamente decorado por formações de espeleotemas: escorrimentos, estalactites, estalagmites, colunas, lustres, etc. Ela possui ainda um ponto de sumidouro, no qual o Barreado torna-se subterrâneo, e um outro ponto de surgência desse córrego. Parte da gruta se desenvolve ao longo de um grande desnível abrupto e possui ao menos três patamares, desses o patamar inferior dá acesso às margens do Barreado (foto 12).
  
Clique na imagem para ampliar. 7 a 9. Zona abrigada que conforma a entrada da Gruta Milagres, é uma área com grande ocorrência de vestígios arqueológicos. 10. O interior também guarda grande quantidade vestígios, sobretudo fragmentos cerâmicos e estruturas de combustão (fogueiras pré-históricas). 11. Lembrança de um mundo de sombras.
   
A zona abrigada à entrada da gruta é bem ampla, os tetos estão a cerca de quatro metros de altura (fotos 7 a 10). Tanto a entrada quanto o interior da gruta apresentam vestígios arqueológicos em superfície: centenas de fragmentos cerâmicos, sobretudo, além de lentes de cinzas. O local sempre foi considerado um bom ponto de pesca de anzol por parte dos moradores locais. Além disso havia uma imagem de uma santa católica, o local era também ponto de peregrinação religiosa, pelo menos desde o século passado.
  
Há uma tradição oral, entre moradores que viveram nos arredores, que menciona que há uns quarenta anos um padre teria feito uma escavação na gruta e retirado um sepultamento humano. É difícil confirmar essas informações pois os antigos moradores vivem atualmente em outras cidades e a área é quase que despovoada. No entanto, no nível inferior da gruta, pouco acima das margens do leito subterrâneo do córrego, há a cova quadrangular de uma escavação, com aproximadamente 1 m².
G. H.
  
Clique na imagem para ampliar. 12. Desnível abrupto da gruta, que dá acesso às margens do córrego Barreado.
  
Slides da palestra sobre a Arqueologia em cavernas de nossa região
Para baixar clique aqui. 

Nota:
1. Ressalta-se que estas visitas foram meticulosamente ordenadas de forma a mitigar o impacto sobre o microambiente destas duas cavidades naturais. Como já escrito acima, o objetivo desta atividade era proporcionar uma experiência empírica para estudantes de graduação que, em um futuro próximo, serão profissionais que atuarão em áreas relacionadas à questão do meio ambiente e, por conseqüência, do patrimônio cultural, especialmente aquele que jaz nos subterrâneos de nossa região. O Museu Arqueológico do Carste, O Espeleogrupo Pains e a Prefeitura Municipal de Pains, repudiam e desestimulam - na medida de seu alcance - práticas de visitação indiscriminada às cavidades naturais de nossa região, e recomendam que o público em geral aguarde até que seja feito um plano de manejo em alguma caverna, o qual deverá ser direcionado para uma visitação pública nos moldes técnicos do turismo cultural e ecológico.

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